É necessário arriscar-se no salto da fé para entender esta estupenda realidade
Confessamos a fé cristã, que nos indica a
perspectiva de uma vida que não tem fim, na eternidade, plena comunhão
com a Santíssima Trindade, a Virgem Maria, os anjos e os santos. Temos a
confiança de que experimentaremos a plenitude da felicidade, para a
qual fomos criados, pelo amor misericordioso de Deus. Com frequência, no
contato com pessoas que se aproximam do limiar de sua entrada na
eternidade, tenho recebido de Deus a graça de anunciar-lhes estes
valores perenes, ajudando-as a superar o receio, aliás, muito natural,
diante do mistério da morte. Ao dar os Sacramentos da Penitência e Unção
dos Enfermos, ouvi fiéis surpreendidos pela linguagem carregada de
alegria e otimismo, com que a Igreja efetivamente celebra o mistério do
Cristo Morto e Ressuscitado, também em tais circunstâncias críticas e ao
mesmo tempo carregadas de sentido. É magnífico vê-los, após os chamados
sacramentos medicinais ou de cura, receberem Jesus Eucaristia, algumas
vezes como viático, alimento de vida eterna, para se aproximarem do
Senhor, em sua Páscoa pessoal!
É com este mesmo espírito de confiança
que a Igreja celebra, no início do mês de novembro, a Solenidade de
todos os Santos, nossa vocação e meta a ser alcançada, e a Comemoração
de todos os Fiéis falecidos. Nossa visita aos cemitérios, nos dias que
se aproximam, pode ser uma bela oportunidade para corajosa profissão de
fé, quando estivermos diante nas sepulturas, nas quais repousam apenas
restos mortais dos nossos entes queridos, com a certeza de que eles e
elas já não se encontram ali, pois, apenas soada a trombeta do Anjo da
Morte, que os chamou, apresentaram-se diante do Senhor, para dar contas
da linda aventura da vida terrena, entendida como um caminho para a
eternidade, pois “está determinado que os homens morram uma só vez, e depois vem o julgamento” (Hb 9, 27).
A Igreja põe em nossa boca expressões
altamente comprometedoras: “Creio em Deus Pai, todo poderoso, Criador do
céu e da terra e em Jesus Cristo seu único filho, Nosso Senhor, que foi
concebido pelo poder do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria, padeceu
sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado, desceu a mansão
dos mortos, ressuscitou ao terceiro dia, subiu aos céus, está sentado à
direita de Deus Pai, todo poderoso, de onde há de vir a julgar os vivos
e os mortos. Creio no Espírito Santo, na Santa Igreja Católica, na
comunhão dos Santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne,
na vida eterna. Amém”.
Deus é Pai, pode tudo, é o Criador! O
Universo não é obra do acaso, mas pensado por Ele, desde a eternidade
com inteligência e amor, finalizado à plena realização de seus filhos e
filhas. Seu poder não é despótico ou autoritário, mas amoroso e
harmônico, de modo que todas as criaturas, voltando-se para Ele,
encontram continuamente seu equilíbrio interior e o justo relacionamento
umas com as outras. Contemplar luz e escuridão, sorriso ou choro, morte
e vida, tudo encontra seu lugar quando se vê do ângulo do último dia da
criação, quando Ele mesmo se encantou com a obra feita: tudo é muito
bom! Acreditar em Deus Criador, saber que não estamos jogados e
perdidos! Quem começa com este risco da fé vislumbra o sentido da
existência!
O mundo não foi deixado ao léu, mas
acompanhado e sustentado com amor por quem o criou. Muitas vezes, na
história que chamamos “da salvação”, Deus ofereceu aliança aos homens e
mulheres. Sinalizou as veredas da felicidade, enviou seus profetas,
formou seu povo, como um pai que educa seus filhos. Se tantas vezes não
foram capazes de escutá-lo, seu amor nunca esmoreceu. A plenitude dos
tempos, com a maturidade da história humana nesta terra, irrompeu como
dom do amor de Deus, quando enviou seu Filho amado, concebido pelo poder
do Espírito Santo no ventre da Virgem Maria. É tão bom e bonito viver
nesta terra, que Deus quis assumir uma carne como a nossa, desejou
percorrer os mesmos caminhos de dores e angústias, esperanças e
alegrias, menos o pecado. E Jesus, filho amado, foi até o mais profundo dos abismos da existência humana.
Tocou com suas mãos todas as etapas da vida humana, dos primeiros
vagidos de recém-nascido até o grito do abandono, no alto da Cruz, para
que nenhum clamor fique sem sentido. Nele e por Ele, tudo encontra seu
rumo de passagem para a vida que não tem fim. Em sua morte nós fomos
resgatados, para ressuscitar com Ele. A dor da morte, que nos assombra
com ares de absurdo, na fé pode ser superada e já está superada, Só que é
necessário arriscar-se no salto da fé para entender esta estupenda
realidade! O Espírito Santo de Deus venha em auxílio de nossa fraqueza
para dizermos “creio”.
Percorridas estas etapas altamente
realizadoras para a existência humana na terra, podemos proclamar a
corresponsabilidade chamada “Comunhão dos Santos”. Ninguém caminha
sozinho e tudo o que fazemos pode contribuir para o bem dos outros! A
própria sombra da morte pode ser iluminada pelo amor mútuo,
experimentado na presença solidária dos irmãos e irmãs. Apoio, consolo,
oração, gestos, tudo o que muitos velórios e enterros cristãos já
testemunharam. É uma das Obras de Misericórdia.
E o Credo continua com “Remissão dos
pecados”. Como Deus não nos fez para o pecado, e cristão que se preze
não se acomoda com o pecado, mas acredita que só em Cristo e na força de
sua Morte e Ressurreição se encontra o perdão, e sabe ser destinado à
salvação. Vale insistir na verdade a respeito do encontro definitivo com
o Senhor, quando a morte chegar. É honestidade anunciar a uma pessoa
que viveu seriamente o cristianismo que a “sua hora” chegou, e
convidá-la a preparar-se bem. Medo, ousadia, precipitação? Nada disso!
Realismo e certeza, esperança da salvação. Uno-me a muitas pessoas que
assim me ensinaram. Desejo abraçar a hora de Deus, quando, onde e como
chegar, como fruto de seu amor misericordioso, que sabe quando estaremos
prontos.
Somos destinados à ressurreição. Cristo ressuscitou de verdade e nos garante que com Ele ressuscitaremos.
“Creio na Ressurreição da carne”. A morte, a inevitável irmã morte
corporal, como a chamou São Francisco de Assis, é passagem, não a última
e definitiva palavra. Desejamos uma morte santa e feliz, desejamos ter
mãos limpas e puro o coração quando chegar a hora. Não é em vão que
pedimos, na Ave Maria, que Nossa Senhora, Mãe de Deus e nossa, rogue por
nós agora e na hora de nossa morte, os dois momentos de que temos
certeza, de hoje até à eternidade.
E com o Credo chegamos à “Vida eterna”.
Nela acreditamos, como cristãos, para ela caminhamos, almejamos os seus
valores e sabemos que começa agora. De fato, como se expressou o Senhor
na Oração Sacerdotal, “esta é a vida eterna: que conheçam a ti, o Deus
único e verdadeiro, e a Jesus Cristo, aquele que enviaste” (Jo 17, 3).
Começa com a fé, adesão a Jesus Cristo, como a qualidade de vida e
santidade que Deus deseja para todos e se prolongará para sempre.
Boa festa de todos os Santos para todos!
Piedosa celebração de Finados e uma excelente preparação para uma boa e
santa morte, no dia marcado pelo amor infinito de Deus por nós!
Nenhum comentário:
Postar um comentário